Câncer - A chave da vida e
da morte
A doença mais mortal do século nasce dentro de cada
um de nós, a partir do mesmo mecanismo que desenvolveu a nossa espécie. Por
décadas, a ciência buscou armas para expulsar o tumor. Mas agora estamos
virando o jogo - o inimigo é o corpo em desequilíbrio. E a resposta para lidar
com o câncer está dentro de você.
No princípio era a sopa primordial. Uma argamassa
de dióxido de carbono, amônia e metano boiando no enorme oceano de 3,8 bilhões
de anos atrás. Não se sabe bem quando, essa mistura começou a se organizar;
formou moléculas complexas e longas correntes de aminoácidos. Algumas dessas
criações desenvolveram a habilidade de se copiar e se espalhar pelo ambiente,
num "crescei e multiplicai-vos" químico. Em pouco tempo, a água
estava tomada. Até aí, nada de muito interessante teria acontecido neste pacato
planeta rochoso, se algumas dessas moléculas não começassem a sofrer mudanças
na hora de se multiplicar. Uma passou a se reproduzir com mais rapidez, outra
viveu mais, e uma terceira ainda descobriu uma forma de se proteger do mundo
exterior criando uma cápsula protetora ao seu redor. Essa molécula
multiplicadora era o tataravô do nosso DNA - e sua cápsula, a membrana celular
das nossas células. Já as pequenas "mudanças na hora de se
multiplicar" são as mutações. São elas que no fim das contas desenvolveram
a vida na Terra: fizeram com que essas células arcaicas virassem bactérias,
fungos, insetos, peixes, dinossauros, aves e, finalmente, nós, macacos pelados
de cérebro avantajado. Sem as mutações não estaríamos aqui. São a chave da vida
e da morte. São elas também as culpadas pela mais temida das doenças do nosso
tempo: o câncer.
O câncer faz parte do processo natural da vida. Na
espreita, dentro de nós, os genes que ativam o câncer esperam por mutações que
possam acordá-los e desenvolver a doença.
Sim, eu e você temos no nosso DNA alguns genes que
podem converter células normais em cancerosas, conhecidos como proto-oncogenes.
Já vieram de nascença. Mas, para o nosso alívio, nem todos despertam.
Teoricamente, três a cinco mutações em genes específicos já seriam o suficiente
para desenvolver um câncer. Mas, em média, um tumor maligno é o resultado de
400 mutações. Ou seja, o resultado de um azar tremendo.
Imagine o corpo como uma grande orquestra,
equilibrada e harmônica. O câncer seria o equivalente a um dos instrumentos,
digamos o violino principal, estar fora do tom. Devagar, aquele som desafinado
começa a contaminar todos os outros, que o seguem. O resultado, você pode
imaginar, é uma barulheira descabida - um equivalente sonoro a um tumor. É
exatamente assim com o câncer, doença que se espalha sorrateira. Ela começa com
uma pequena inflamação, pode ser algum químico do cigarro ou fuligem, por
exemplo, que se aloja no pulmão. Para expulsá-lo, nosso sistema imunológico vai
até lá lutar contra ele e desencadeia um processo inflamatório. Nessa briga,
pode ser que alguma célula do corpo leve a pior: a toxicidade do alcatrão, por
exemplo, pode acordar um oncogene e alterar para sempre seu DNA. Mutante, ela
começa a se dividir e multiplicar descontroladamente, muito mais do que as
companheiras: uma das características principais do câncer. Se novas mutações
aparecerem, e uma delas desligar a capacidade natural do organismo de matar as
células, por exemplo, ferrou: o câncer surgiu.
CÂNCER:
- Mais de 100 tipos.
-
60 órgãos podem desenvolver câncer.
-
10% dos casos são hereditários.
-
90% são associados a fatores ambientais.
Entre quem tem câncer hoje 50% estarão vivas daqui
a 5 anos mais de 40% daqui a 10 anos
5
hábitos de risco originam 30% das mortes:
-
Obesidade
-
Falta de frutas e vegetais
-
Falta de atividade física
-
Cigarro
-
Uso de álcool
Os
mais comuns:
-
12,7% pulmão
-
10,9% mama
-
9,8% colorretal
-
7,8% estômago
-
7,1% próstata
Os
que deixam mais sobreviventes:
-
Mama
-
Próstata
-
Colorretal
-
Útero
O câncer é a segunda doença que mais mata no mundo
(em 2008, quase 14%, ou 7,6 milhões, das mortes foram causadas por ele, segundo
a Organização Mundial da Saúde). Mas, se todos nós temos oncogenes, por que só
alguns morrem por causa deles? Nos últimos anos, os tratamentos da doença vêm
surtindo efeito: nos EUA, de 1950 até 2007, as mortes por câncer diminuíram 8%.
Os oncologistas brasileiros garantem a cura de até 70% dos doentes em estágio
inicial. Mas os ganhos não foram suficientes para anular as perdas. No Brasil,
a parcela de culpa do câncer pelas mortes totais passou de 8% em 1980 para 15%
em 2010 (já que os tratamentos das outras doenças avança rapidamente).
"Até agora tivemos um progresso, é inegável. Mas, se muita gente segue morrendo,
precisamos pensar diferente" diz David Agus, oncologista e autor do livro
Uma Vida sem Doenças. "Uma forma é entender o câncer como um verbo. Você
não `tem câncer', você está `cancerando'." Se é um verbo, fica fácil
explicar por que a incidência do câncer cresce junto com a expectativa de vida.
As células do seu corpo não param de se reproduzir - e cada divisão pode gerar
alguma mutação e despertar um oncogene. Em uma pessoa idosa, o DNA já foi
copiado tantas vezes, que o risco de erros é muito maior. Pense num xerox de um
xerox - é sempre pior do que a primeira cópia.
Se a doença convive com a gente, ela também
dificilmente será extinta, ao contrário do que a humanidade sonhava. Por muito
tempo, os cientistas se preocuparam em buscar armas e munições contra os
tumores, como se fossem um inimigo externo que precisa ser expulso a qualquer
custo. Não entendiam que ele faz parte de nós. "Se a doença cresce, é
porque o corpo todo está doente, não apenas um órgão", diz Agus. Em outras
palavras, o câncer só cresce quando seu organismo falho permite - quando aquele
primeiro violino saiu do tom. E é para esse lado que a oncologia começa a
olhar: para dentro de você, à procura do reequilíbrio do corpo.
Corta
aqui, tira ali
Sentada no sofá da sala em São Paulo, numa tarde de
sábado, Carmela Talarico sentiu um caroço na mama esquerda. Descobriu por
acaso, enquanto coçava o braço. Aos 56 anos, ela sabia o que aquilo podia ser.
Na segunda-feira, correu até o médico e marcou os exames que confirmariam o
óbvio: estava com câncer de mama. O tumor não passava de um centímetro, mas ela
teria de enfrentar uma operação para retirá-lo. Naquela época, começo dos anos
80, as ideias de William Halsted, cirurgião americano, ainda influenciavam os
oncologistas de todo o mundo. Halsted só viveu até o ano de 1922, quando pouco
se sabia sobre o câncer, mas defendia que se devia eliminar o maior número
possível de tecidos ao redor dos tumores para não deixar nenhum fragmento para
trás, o que possibilitaria o surgimento de um novo tumor.
Em outras palavras, Halsted mandava caprichar na
faca.
Suas cirurgias radicais desfiguravam as pacientes.
"Na Europa, um cirurgião tirou três costelas e outras partes da caixa
torácica e amputou um ombro e a clavícula de uma mulher com câncer de
mama", conta Siddhartha Mukerjee, oncologista e professor de medicina da
Universidade de Colúmbia, no livro O Imperador de Todos os Males.
Foi essa a cirurgia que Carmela encarou.
Felizmente, não foi necessário amputar o ombro ou a clavícula, mas Carmela
perdeu a mama esquerda inteira, o músculo peitoral e os gânglios debaixo do
braço. Com quase 90 anos, ainda no mesmo sofá e apartamento, sem nenhuma
prótese, ela conta feliz: "Se tivesse um tumor do outro lado, faria tudo
de novo". Se o câncer tivesse aparecido poucos anos depois, Carmela teria
escapado da cirurgia radical. Em 1981, um estudo americano comprovou que a
mastectomia radical não apresentava nenhum benefício em relação à cirurgia
simples (retirada de só um pedaço da mama) ou cirurgia acompanhada por
radioterapia. Anos mais tarde, em 2004, a filha de Carmela, Eliane, também se
deparou com caroços - mas só precisou retirar um quarto da mama direita, além
de encarar doses de radioterapia e quimioterapia.
Remédios quimioterápicos, aliás, já existiam há
alguns anos. O primeiro deles surgiu, por acaso, durante a 1ª Guerra Mundial.
Pesquisadores perceberam que pessoas expostas ao gás mostarda apresentavam uma
drástica redução de glóbulos brancos, porque ele afeta a medula óssea. Em 1946,
cientistas testaram a droga em pacientes com linfomas (câncer das glândulas
linfáticas). Funcionou por um tempo. Mas logo apareceram as recaídas. A
primeira droga a curar de verdade o câncer apareceria só em 1960, quando dois
pesquisadores conseguiram acabar com um câncer raro na placenta de uma
paciente.Qualquer remédio de quimioterapia atinge células que se dividem
rapidamente - sejam elas normais ou cancerosas. É por isso que pessoas em
tratamento perdem o cabelo, por exemplo. E é por isso também que essas terapias
causam tantos efeitos colaterais. Os primeiros pacientes tratados com cisplatina,
nos anos 70, sentiam tanta fraqueza e náusea que vomitavam quase 12 vezes por
dia. Chegavam à beira da morte. Hoje, a indústria farmacêutica já criou
remédios capazes de reduzir os efeitos. Por anos, a estratégia dos cientistas
foi testar qualquer tipo de substância - plantas, químicos, remédios - para
tentar destruir o câncer, como se ele fosse causado por vírus ou bactérias.
Demorou para entender que o perigo morava tão perto.
Ambiente
externo - Reequilibrar o ambiente doente ao redor
de um tumor pode ajudar a combatê-lo
Uma equipe do Berkeley Lab, nos EUA, liderada pela
pesquisadora Mina Bissell, investigou as diferenças entre células mamárias
normais e tumorosas. E descobriu que o ambiente ao redor das células ajudava a
determinar se elas deveriam fazer leite materno (estado normal) ou crescer
desenfreadamente.
O que eles perceberam foi uma enorme quantidade de
uma proteína chamada TGF-Beta 1 ao redor das células tumorosas. Se pudessem
reduzir essas proteínas, será que a célula danificada se transformaria numa
normal outra vez?
Deu certo. Analisar o ambiente em volta da célula
tumorosa mostrou qual proteína estimulava o crescimento do câncer. E anulá-la
foi suficiente para reverter o processo da doença.
Tiro
ao alvo
Só em 1976, os pesquisadores se deram conta de que
havia uma ligação entre câncer e os defeitos no DNA. Até então, a maioria deles
se dedicava à busca de um possível vírus causador da doença. Peyton Rous, um
médico americano, havia descoberto, ainda no início do século, um retrovírus
que causava sarcoma em galinhas (um tipo de tumor que se desenvolve em tecidos,
como osso ou músculo). Sem encontrar explicação para o câncer, a ideia do vírus
atraiu os pesquisadores - tanto que, em 1950, chegou a ser criado, nos EUA, um
Programa Especial de Vírus do Câncer. A busca não deu em nada: raros tipos de
câncer são causados por micro-organismos. O que descobriram foi que o tal vírus
dos sarcomas das galinhas na verdade não causava câncer. O que ele fazia era
transportar para dentro dos animais um gene específico - e este, sim, alterava
as células e fazia com que elas começassem a se dividir loucamente. Como um
software que, uma vez instalado, faz a máquina inteira rodar de uma nova forma.
A descoberta mudou o rumo da história do câncer. Os
dois pesquisadores logo perceberam que genes normais podiam, sob influência de
fatores externos, se transformar em oncogenes. E, se a culpa era deles, talvez
fosse possível desmascará-los e desativá-los. Começou então uma nova maneira de
encarar a doença. Um dos caminhos foi olhar para as moléculas produzidas por
ordem dos genes: as proteínas. São elas que regem todo o equilíbrio do corpo e
podem mandar, por exemplo, uma célula se duplicar rapidamente e virar um tumor.
"Mudanças no DNA alteram a estrutura das proteínas. Assim, é possível
desenvolver remédios que inibem sua ação e corrigir o defeito", explica
Luiz Fernando Reis, diretor de pesquisa do Hospital Sírio-Libanês, em São
Paulo. Só que a tarefa não é das mais fáceis: cada câncer envolve dezenas de "agentes"
diferentes para se desenvolver - e estima-se que existam mais de cem tipos
diferentes de câncer.
Fácil não é, mas a americana Barbara Bradfield teve
sorte. Em 1990, ela descobriu um caroço debaixo do braço e nos seios. Tinha
câncer de mama - e pior: ele já tinha se espalhado nos nódulos linfáticos.
Enfrentou quimioterapia e perdeu parte da mama. Ainda assim, um ano depois, o
câncer reapareceu - e se espalhou em metástase. A morte era questão de tempo.
Mas não foi o que aconteceu. Dois pesquisadores estavam trabalhando havia cinco
anos para tratar especificamente aquele tipo de câncer, que precisa de uma
proteína chamada Her-2 para sobreviver. Eles perceberam uma quantidade enorme
dessa molécula do lado de fora das células cancerosas e encontraram um remédio
que parecia desligar sua produção. Durante nove semanas, Barbara recebeu a
droga recém-descoberta. O câncer desapareceu, num caso inédito. Assim como o
câncer, a cura também estava dentro dela. Os pesquisadores continuaram com os
testes e, em 1998, os EUA autorizaram o uso do medicamento, o Herceptin. Desde
então, apareceram mais de 20 remédios que acertam em cheio as células
cancerosas, as terapias-alvo - durante muito tempo a grande esperança da luta
contra a doença. Ao contrário da quimioterapia, eles poupam as células
saudáveis e destroem apenas as malignas.
Mas 20 ainda é pouco. Uma maneira de aumentar a
criação de remédios específicos para cada paciente partiu do próprio David Agus
com a ajuda do engenheiro da computação e inventor Daniel Hillis. Eles
inventaram um computador capaz de tirar uma sequência de fotos das proteínas do
corpo em ação - algo como ouvir, em tempo real, a conversa entre todas as
nossas células, a música tocada na nossa orquestra interna. Só que fazer isso
não é uma tarefa fácil. A cada minuto, as proteínas do seu corpo mudam. Se você
tirar uma amostra de sangue agora e ir ao banheiro e tirar outra depois, as
moléculas serão outras. Pode haver modificações até mesmo durante a análise do
sangue no laboratório. Parecia impossível chegar a resultados confiáveis.
Depois de seis anos de trabalho, em 2009, a dupla
conseguiu. Com conhecimentos sobre robótica, computação paralela e uma técnica
capaz de avaliar as características individuais de cada molécula, Hillis
conseguiu fazer imagens em alta definição das proteínas humanas. Uma gota de
sangue gera um retrato tão complexo que ocupa um espaço de 40 gigabytes. Agora
a missão é identificar quem é quem e qual o papel de cada proteína. (Entenda a
complexidade abaixo.) Quando isso acontecer, encontrar remédios que atinjam as
células malignas de cada tipo de câncer, em cada pessoa diferente, pode ser
moleza. A esperança é que possamos desenvolver remédios para 10 mil proteínas
diferentes, e não só as 500 que pesquisamos hoje em dia. "A terapia-alvo
olha só para a doença, para uma célula individual. A proteômica olha para a
doença e para o entorno dela, para seu metabolismo, para todo o conjunto. Então
dá para saber qual remédio funciona melhor para você", explica Agus.
Diga
xis - Entenda a análise de todas as proteínas
do seu corpo
Com este retrato, é possível saber tudo o que
acontece no corpo - ver como seu organismo responde a cada remédio (ou comida,
ou substância cancerígena) e se algo vai mal lá dentro. O excesso de uma
determinada proteína pode constatar que algo está errado com seu estômago, por
exemplo.
1.
Uma gota de sangue pode gerar um retrato de todas as proteínas do corpo.
2.
Computadores medem a distribuição, o tamanho e a ocorrência de cada uma delas
em resposta a um remédio específico.
3.
Assim, dá para comparar o retrato proteico de duas pessoas diferentes e traçar
o perfil de cada uma.
4.
Se duas pessoas tomam um remédio e respondem a ele de forma diferente, já
sabemos qual proteína é a responsável.
Comparando
os dois exames ao lado, dá para perceber que um mesmo tratamento liberou
proteínas diferentes em João e em Maria - ou seja, também será mais eficiente
em um do que em outro. Um simples exame de sangue poderá detectar isso. E será
possível encontrar um medicamento específico para cada doença, em cada pessoa.
Tudo
é um só
A cura definitiva para o câncer ainda não existe. E
o mais provável é que ela nunca aconteça, deixando os cientistas do planeta
inteiro frustrados (e a SUPER também: há 12 anos, publicamos que o câncer
"estava com os dias contados". Ops). A OMS acredita que o número de
mortes por câncer, em 2030, chegará a 17 milhões por ano - pouco mais do que o
dobro de casos relatados em 2008. Culpa do envelhecimento da população. O
câncer não vai embora, mas tende a virar cada vez mais uma doença crônica, como
o diabetes ou a pressão alta. Que o diga David Servan-Schreiber, neurocientista
francês, professor de medicina da Universidade de Pittsburgh. Em 1992, ele
trabalhava em um laboratório de neuroimagem, quando um dos pacientes agendados
do dia não compareceu. Para passar o tempo, ele então decidiu se enfiar na
máquina de ressonância magnética e se autoanalisar. Descobriu um tumor maligno
no cérebro. Passou por cirurgia e quimioterapia. Oito anos depois, o câncer
voltou. Depois de mais cirurgias e sessões de rádio e quimioterapia, David
decidiu procurar alternativas - não com o objetivo de abandonar os tratamentos
tradicionais, mas para aumentar suas chances de cura. "Fui procurar na
literatura científica um jeito de ajudar meu corpo a vencer o câncer. E
descobri que o jeito como vivemos e comemos aumenta a incidência do
câncer", disse em um seminário há alguns anos. Ele mudou a dieta e passou
a praticar mais exercícios físicos.
Schreiber não estava sozinho. Outros pesquisadores
também acreditam que o estilo de vida pode prevenir ou ajudar o organismo a
lutar contra o câncer. Uma vida mais saudável e regrada fortalece o corpo - e,
assim, o sistema imunológico ganha um empurrãozinho também. "O câncer não
é doença de um órgão só, é o sintoma de um desequilíbrio geral do corpo",
diz David Agus. "Você diz que sua casa 'está com um problema de água',
quando vê uma poça de água na sala? Ou você procura onde está o vazamento? Não
basta secar a água, é preciso consertar o encanamento. É o mesmo com o câncer,
envolve todo o sistema", diz Agus.
A ciência não sabe listar com precisão todos os
fatores que podem causar câncer. Herança genética tem uma parcela pequena de
culpa: de 5 a 10%. Já fumar é quase suicídio: 90% dos casos de câncer no pulmão
vêm do cigarro (dos 10% restantes, quase 4% dos pacientes são fumantes
passivos). O álcool também aumenta em 5% a incidência de câncer de mama. E
outros vários pequenos fatores aumentam os riscos de desenvolver algum tipo de
câncer: pesticidas e inseticidas, o contato da pele com o alumínio (atenção com
o desodorante), a exposição excessiva ao sol, alguns cosméticos (com parabeno,
conservante encontrado em xampus e cremes, ou tolueno, presente em esmaltes,
por exemplo), produtos de limpeza, e por aí vai.
Em contrapartida, como você já está cansado de
saber, dormir oito horas por dia, praticar atividades físicas, comer mais
vegetais e frutas, sempre nos mesmos horários, ajuda a prevenir e enfraquecer o
câncer. Sim, definir horário para cada atividade (principalmente na hora de se
alimentar) é tão importante quanto o que comer.
"Se você come todos os dias às 13 horas e, por
acaso, hoje vai comer às 15 horas, seu corpo passou duas horas sob
estresse", diz Agus. "O câncer é uma inflamação. Qualquer tipo de
estresse, mesmo emocional, faz você produzir substâncias inflamatórias. Então,
a substância vai até um órgão qualquer e diz 'nflama'. É um gatilho para
desenvolver um problema", completa Daniela Jobst, nutricionista funcional.
E é por isso que Agus recomenda todo cuidado para evitar inflamações: desde
vacina contra gripe até aspirinas. "O que inflama hoje no seu corpo pode
ter um resultado pior daqui a alguns anos", diz.
Para
não dar sorte ao azar
Não há uma fórmula mágica - e, sim, pequenas
atitudes que podem ajudar a combater a doença
-
Adote um cachorro
Ele vai ajudar a manter uma rotina. Você será
obrigado a levá-lo para passear ou a dar comida todos os dias no mesmo horário.
Comer, dormir e fazer exercícios físicos sempre no mesmo horário deixa seu
corpo menos estressado.
-
Não fique muito tempo sentado
É tão prejudicial ao corpo quanto fumar. Passar
horas sentado muda todo o metabolismo de um corpo feito para ficar em pé:
aumenta as taxas de colesterol no sangue e pressão arterial.
-
Tome vacina contra gripe
A gripe espalha pelo corpo diversas inflamações e,
para vencê-las, seu sistema precisa de muito esforço. Assim, seu corpo sofre um
imenso desgaste, envelhece mais rápido - e abre possibilidade para algo pior
depois.
-
Use sapatos confortáveis
Esqueça o salto alto e o bico fino. Sapatos confortáveis
são a melhor maneira de evitar inflamações nas articulações e coluna lombar.
-
Prefira orgânicos e congelados
Orgânicos são sempre melhores. Mas, se você compra
verduras no mercado, prefira os congelados. No momento em que saem do solo ou
das árvores, os alimentos frescos começam a perder os nutrientes. No caminho
até a venda, quase tudo já se foi.
Mesmo com todos os cuidados e as tentativas de
reestabelecer o equilíbrio no organismo, David Servan-Schreiber perdeu a luta
para o câncer. Em 2010, os tumores reapareceram e, um ano depois, o corpo do
cientista não resistiu. David nunca abandonou os tratamentos tradicionais
(cirurgia, quimioterapia e radioterapia). Mas ele superou as expectativas. Em
geral, após o diagnóstico de tumores malignos no cérebro, apenas 15% das
pessoas vivem mais de cinco anos. Menos de 10% vivem dez anos ou mais. O câncer
precisou de 20 anos para derrubar David.
Não
dá para falar em derrota.
A tendência é que isso aconteça para todos os
pacientes no futuro: a qualidade de vida durante o tratamento aumente, a
reincidência diminua e as chances de cura cresçam. Vamos viver mais e melhor. É
isso que prometem os tratamentos personalizados e os que entendem o câncer como
um pedaço natural de nós. Pode ser que um copo de vitamina C seja bom para você
e péssimo para mim. Vai ser possível também descobrir a presença de tumores por
meio de um simples exame de sangue. Aí, sim, manteremos o equilíbrio completo
do seu corpo e, se fizermos tudo direitinho, preveniremos a doença - você vai
saber exatamente como restaurar as forças que trabalham contra seu corpo. É
como a medicina oriental, que há séculos entende e trata o organismo como um
todo. Por todo esse tempo, estávamos olhando para o lugar errado. Mas agora
estamos acertando a mira.
Fonte: Revista Superinteressante(Abril)
Reportagem: Carol Castro Edição: Karin Hueck
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